22 de julho de 2015

A queda de braço entre bancos e pequenas empresas

De um lado, oferta de crédito restrita e burocrática. De outro, empresários demandam recursos para alcançar diferentes objetivos, que vão desde esticar o prazo de pagamento de uma dívida a investimentos. Mas a negociação esbarra nas condições que o banco impõe para se proteger e a dificuldade vivida pela pequena empresa nesta crise. Entenda: somente quem vai investir conseguirá estabelecer um diálogo fácil com os bancos.
Com o peso dos custos e a queda na receita, 18,5% das empresas industriais do Estado de São Paulo estão preocupadas com a possibilidade de não conseguir honrar os compromissos com os bancos até o final deste ano.
Depois de demitir, muitas estão mantendo a operação para pagar funcionários e fornecedores, deixando de lado o pagamento de impostos – o que também dificulta a obtenção de linhas de crédito do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
Um estudo conduzido com 506 empresas pelo Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos (Depecom) da Federação e do Centro das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp e Ciesp) mostra que a inadimplência das empresas que tomaram financiamento de longo prazo chegou a 13,7%.
Este percentual é maior entre as microempresas do setor (25,6%) e as pequenas empresas (19,8%). Questionadas se conseguirão pagar os financiamentos de longo prazo em 2015, dirigentes de 23,2% das empresas disseram que não. Essa expectativa é ainda maior entre as microempresas (35,9%) e as pequenas empresas (33%).
“Já demiti 120 pessoas, a metade dos funcionários de minha empresa. Meu faturamento caiu pela metade em dois anos. Como estou inadimplente com os impostos não posso obter o capital de giro do BNDES”, disse Heitor Alves Filho, presidente do Sindiroupas (sindicato que representa a indústria de moda masculina), durante seminário na Fiesp.
João Paulo Faleiros, economista do BNDES, disse que a instituição não pode conceder crédito com recursos do Tesouro Nacional e do FAT (Fundo de Amparo ao Trabalhador) a empresas que não estão com o pagamento de impostos em dia.
Além do BNDES, representantes de outros dois bancos falaram sobre linhas de reestruturação de crédito e suas condições na Fiesp.
“O que recomendamos é ir ao banco logo que perceber que não conseguirá pagar a parcela de uma dívida. É preciso falar que o faturamento diminuiu. Fica mais fácil renegociar”, diz Rodrigo D’Alvia, gerente de mercado pessoa jurídica do BB.
Já Thiago Gomes de Souza, gerente geral da Caixa Ecônomica Federal, disse que a taxa de repactuação de crédito no banco está na faixa de 1,18% a 2,30% ao mês: “Para o cliente que está inadimplente com impostos conseguimos atender em parte. Só não para os que estão em débito com o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) ”.
Na hora de negociar com o banco é preciso ser claro e transparente, recomenda Claudio Miquelin, diretor do Dempi (Departamento da Micro, Pequena e Média Indústria), da Fiesp. “A vantagem é que o banco não quer matar a gente porque precisa receber”, afirma.
FALTA ÂNIMO A EMPRESAS E BANCOS
No impasse entre bancos e pequenas empresas sobram argumentos de cada lado, mas restam poucas soluções imediatas. O fato é que a própria demanda por crédito da indústria caiu 9,3% em junho ante igual mês de 2014, de acordo com uma pesquisa da Serasa Experian.
Afinal, em ano de recessão econômica os ânimos de quem empresta e de quem toma recursos estão mesmo mais baixos. Era este o clima reinante na Sala de Crédito, organizada pelo Dempi, no qual representantes de três bancos – Banco do Brasil, Bradesco e Caixa–, além de profissionais da própria Fiesp orientaram empresários sobre os caminhos para obter financiamento e reestruturar dívidas.
O projeto já despertou mais interesse dos dois lados do balcão. Em 2013, por exemplo, teve a participação de mais duas instituições financeiras, como o Santander e a agência de fomento paulista Desenvolve SP.
E também de mais empresários tirando dúvidas. Entre as 13h e 16h desta terça-feira (21/07), o movimento na sala foi mais fraco. Dois industriais de pequeno porte, que pediram anonimato, disseram ter ido ao local para encontrar uma linha que permita alongar o prazo de pagamento de dívidas tomadas anteriormente para manter a operação.
Ambos não estão inadimplentes funcionários e fornecedores -mas deixaram de pagar impostos. Planejam quitar as prestações em aberto com outros bancos e concentrar o financiamento em uma só instituição –sem alteração na taxa de juro anteriormente contratada e prazo de cerca de um ano para começar a pagar.
O problema é que ouviram como resposta que seria necessário obter uma nova linha a uma taxa de juros maior.
“Muitas vezes é melhor o empresário pagar as parcelas nas linhas que já contratou. O momento não é de antecipar e liquidar débitos, mas de alongar em cada banco”, diz Flávio Vital, assessor da diretoria do Dempi. Ele aconselha o empreendedor a fazer uma projeção do fluxo de caixa para cinco anos, para saber exatamente quanto precisa de crédito e para qual objetivo.
Um exemplo discutido na Sala referia-se a uma empresária que estava pagando 0,85% ao mês em uma linha na Caixa e queria mudar, mas agora o juro médio para capital de giro na mesma instituição está em 2,10% ao mês. A conclusão é que compensa continuar pagando os financiamentos já contratados em outros bancos privados.
Quem saiu satisfeita da consultoria foi Adriana Baruch, diretora da Labyes, uma pequena indústria farmacêutica veterinária, voltada a cães e gatos, principalmente os idosos. É uma subsidiária de uma empresa da Argentina que chegou ao Brasil em 2009, mas está no mercado brasileiro por meio de distribuidores desde 1999.
Como o mercado pet não esmoreceu diante da crise -entre outras razões por haver cada vez mais casais que optam por ter animais de estimação, em vez de filhos- a empresa busca financiamento de cerca de R$ 1 milhão para construir um depósito e escritório em um terreno adquirido em Valinhos, no interior paulista.
A segunda etapa é a construção de duas pequenas fábricas no local. “Um dos bancos que consultei tem uma linha específica para o meu objetivo. Na verdade, já tenho outras propostas e queria comparar”, diz Adriana.
Quem também tirou aprendizado da Sala de Crédito foi Naira Bonifácio, CEO e sócia da Bright Photomedicine, startup que busca recursos da ordem de R$ 150 mil para desenvolver um laser analgésico.
Naira diz ser difícil a tomada de capital de giro para a contratação de profissionais e o processo de testes e regulamentação, já que se trata de um negócio pré-operacional, ou seja, que ainda não gera caixa.
“Não queremos ir direto para um fundo de investimento ou recorrer ao capital de anjos (investidores individuais). Na consultoria, recomendaram que, antes de ir ao banco, eu aprofunde o modelo de negócios da empresa para saber quanto pedir para cada etapa do projeto e quando”, conclui.
Fonte: Diário do Comércio

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